“… resíduos se transformam em energia e fertilizante, diminuindo custos financeiros e
ambientais …”
O Brasil é o 4° país maior produtor e exportador carne de suína, tendo como principal destino das exportações o continente asiático.
Em entrevista exclusiva para a AgriBrasilis, Paulo Lucion, CEO da Nutribras Alimentos, fala sobre suinocultura e autossutentabilidade. Lucion iniciou o negócio no Mato Grosso em 2000, em busca de uma diminuição nos custos de produção, quando uma crise na produção de suínos afetou as fazendas na região sul do país. A empresa foi pioneira a introduzir o modelo de suinocultura autossustentável no país. Hoje a Nutribras atua na plantação de grãos, criação de suínos, abate, processamento e distribuição de carne, com capacidade de abater e processar três mil suínos por dia, com um faturamento de US$ 103.742.504,04 em 2020.
Como é o sistema sustentável na suinocultura e quais as diferenças em relação à criação convencional?
Paulo Lucion – A suinocultura tem uma versatilidade singular para potencializar a sustentabilidade de uma propriedade rural. A primeira decisão é implementar um sistema de tratamento dos efluentes com biodigestor. A partir do biodigestor são gerados dois produtos, o biofertilizante e o biogás. O biofertilizante (adubo orgânico) interage de maneira sustentável com a agricultura, pois substitui o adubo químico, e dessa maneira melhora a performance da produção agrícola e contribui para a fertilidade do solo sem deixar resíduos químicos, potencializando assim a produção agrícola e contribuindo para a biodiversidade do meio ambiente.
O biogás por sua vez é utilizado como combustível para motores que acionam geradores de energia elétrica, sendo assim, cada granja de suínos provida de biodigestor e gerador de energia é como se fosse uma pequena usina produtora de energia renovável. Assim, a criação completa o ciclo de sustentabilidade na propriedade rural. Entre os pilares da sustentabilidade o respeito ao meio ambiente, aparece como uns dos principais, se somando ao bem-estar animal e separação e destino seletivo do lixo. Sendo assim, em relação ao bem-estar animal, a climatização das instalações dos suínos é um bom exemplo de sinergia, pois só é viável se a propriedade produzir sua própria energia elétrica, que nesse caso será gerada através do biogás. Em relação ao lixo, é realizada coleta seletiva e os frascos de vacinas e medicamentos são recolhidos por empresa especializada e destinados a uma central que faz os procedimentos seguros para efetuar a reciclagem, o lixo reciclado também é coletado por empresa especializada desse setor, e o lixo orgânico é destinado para composteira, onde também é o destino dos animais mortos, e após o composto estar pronto, também serve de adubo orgânico.
A suinocultura convencional, é a propriedade onde não realiza esse ciclo de sustentabilidade, ou seja, não potencializa outros segmentos da economia.
Qual o passo a passo do sistema da transformação de resíduos em energia?
Paulo Lucion – Os efluentes das granjas entram no biodigestor, onde existe uma grande população de bactérias que se alimentam de matéria orgânica, que o efluente é rico. Essas bactérias ao fazer a digestão da matéria orgânica, produzem gás (o biogás), que é rico em gás metano, que tem alto potencial de combustão. Esse gás é usado como combustível em motores, que por sua vez movimentam geradores de energia elétrica.
Quais os benefícios da transformação dos resíduos em energia? O que isto representa em valores numéricos?
Paulo Lucion – A produção de energia é muito viável. O valor do Kilowatt de energia aqui no Mato Grosso varia entre R$ 0,47 a R$ 0,96. A demanda da Nutribras chega a 2.000 Kw/h e a geração de energia em todas as granjas gera aproximadamente 2.500 Kw/h.
Qual o potencial da América Latina na produção de energia a partir dos resíduos da criação de suínos?
Paulo Lucion – Teoricamente cada 2.000 matrizes em ciclo completo tem potencial de gerar 5.000 KW por dia. Os dados do USDA mostram que em 2019 a América Latina produziu 5,85 milhões de toneladas de carne suína, deste total o Brasil foi responsável por 4 milhões de toneladas e fechou o ano com rebanho estimado de 1.931.000 matrizes alojadas, o que significa que a América Latina fechou 2019 com um rebanho aproximado de 2.825.000 matrizes alojadas, onde podemos estimar um potencial de gerar 7.062 megawatt de energia por dia.
Além da energia, a Nutribras também produz ração para suas granjas. Quais medidas são tomadas para garantir que esta etapa do processo seja mais sustentável?
Paulo Lucion – A Nutribras Alimentos tem investido para aumentar a área de agricultura com adubação orgânica de biofertilizante, com meta para ser auto suficiente na produção de soja e milho, assim, quanto mais milho utilizarmos nas rações provenientes de áreas com adubação orgânica, mais contribuímos para a sustentabilidade. Por outro lado, trabalhar com uma “nutrição de precisão”, evita desperdícios e diminui o uso dos recursos naturais. A demanda de energia elétrica também é atendida com a produção gerada pelos geradores movidos a biogás da empresa.
Quais características do biofertilizante gerado através dos biodigestores? Qual seu valor?
Paulo Lucion – Este adubo orgânico é rico em nitrogênio, fósforo e potássio. Sua aplicação na agricultura, reduz o custo de produção e potencializa a produtividade devido ao fato de melhorar a matéria orgânica do solo. Considerando sua composição podemos considerar hoje que ele diminuiria o custo de uma adubação convencional química em US$ 250 / hectare de lavoura de milho.
Quais as perspectivas destas inovações nos países da América Latina?
Paulo Lucion – Essa resposta é muito peculiar para cada país, pois depende muito de legislação ambiental, incentivos governamentais e políticas de desenvolvimento. No Brasil que é o maior produtor de suínos da América Latina, essas tecnologias estão bem difundidas, e os suinocultores estão cientes dos seus benefícios, eu acredito que se tiverem acesso a crédito com custos compensatórios em poucos anos quase a totalidade da suinocultura brasileira vai ter a sustentabilidade como alicerce das propriedades rurais.
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